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Gilmar Mendes vota pela inconstitucionalidade do marco temporal, mas mantém pontos que preocupam povos indígenas

Voto do relator no STF rejeita o marco temporal, e votação continua com expectativa de posicionamento dos demais ministros.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes votou pela inconstitucionalidade da tese do marco temporal, que tenta limitar o direito dos povos indígenas às terras que estivessem ocupando ou disputando no momento da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.

O voto foi recebido como um avanço importante na defesa dos direitos originários. No entanto, o posicionamento do relator também preserva dispositivos problemáticos e que podem, na prática, manter insegurança jurídica e conflitos nos territórios

Relator das ações que questionam a validade da norma aprovada pelo Congresso Nacional, Gilmar abriu, nesta segunda-feira, uma sessão extraordinária no plenário virtual do STF. O julgamento segue aberto até as 23h59 da próxima quinta-feira (18), período em que os demais ministros poderão apresentar seus votos.

Durante o voto, o ministro reconheceu que o marco temporal desconsidera a história de expulsões forçadas, violência estatal e perseguições sofridas por povos indígenas ao longo de séculos, tornando injusta a exigência de comprovação de presença física em 5 de outubro de 1988. 

Apesar dessa análise, o ministro defendeu a manutenção da regra que autoriza a permanência do atual ocupante da terra indígena até que haja indenização, além de validar a participação de estados e municípios nos processos de demarcação, pontos que são preocupantes.

Outro ponto sensível é a ampliação do papel de estados e municípios nas demarcações. Organizações indígenas alertam que essa participação pode abrir espaço para interferências políticas locais, muitas vezes alinhadas a interesses do agronegócio, da mineração e de grandes empreendimentos, historicamente responsáveis por pressionar e violar direitos indígenas. Na avaliação dessas organizações, a medida fragiliza a condução técnica do processo, que hoje é atribuição da União.

Embora Gilmar Mendes tenha afirmado que o país não pode seguir convivendo com “feridas abertas há séculos” e que é necessário adotar soluções mais humanas para os conflitos no campo, o movimento indígena aponta que manter salvaguardas aos ocupantes ilegais e descentralizar o processo de demarcação pode perpetuar essas mesmas feridas.

A tese do marco temporal, mesmo questionada pelo voto do relator, continua sendo defendida por setores ruralistas e é apontada como responsável pelo aumento da violência no campo e pela insegurança jurídica. Para os povos indígenas, o julgamento em curso no STF é decisivo não apenas pelo resultado final, mas pelos parâmetros que serão fixados para o futuro das demarcações.

Enquanto a votação segue no Supremo, lideranças indígenas acompanham o processo com atenção e mobilização, reforçando que não basta derrubar o marco temporal se outras medidas continuarem relativizando os direitos constitucionais. A defesa é clara: terra indígena não é objeto de negociação, compensação ou espera,  é direito originário garantido pela Constituição.

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